sexta-feira, 19 de maio de 2017

MANOEL GONÇALVES

Projeto de Lei 187/27 - CEP: 35680-055
Denomina logradouro público: Rua Manoel Gonçalves / Centro


Lei nº 187 de 29 de janeiro de 1927
Mudando o nome de algumas ruas da cidade

O Povo do município de Itaúna, por seus vereadores, decretou, e eu em seu nome, sanciono a seguinte Lei:
Art 1º — Ficam mudados os nomes das ruas Tiradentes para Antônio de Mattos; Matriz para MANOEL GONÇALVES e 15 de Junho para Josias Machado.
Art. 2º — Revogam-se as disposições em contrário.
Mando, portanto, a todas as autoridades a quem o conhecimento e execução da referida Lei pertencerem, que a cumpram e façam cumprir tão inteiramente, como nela se contém.
Sala das Sessões da Câmara, 29 de janeiro de 1927
Dario Gonçalves de Souza — Presidente

Registrada e publicada nesta Secretária, aos 29 de janeiro de 1927
Sílvio de Mattos — Membro


Manoel Gonçalves de Souza Moreira
(Manoelzinho do Hospital)
(*1851 +1920)


1ª Biografia

Nasceu em Santana do São João Acima, aos 19 de dezembro de 1851, filho de Manoel José de Souza Moreira e de Dª Ana Joaquina de Jesus. Seu pai, Manoel José de Souza Moreira, nascido em Bonfim, em 5 de fevereiro de 1829 e falecido em Sant'Ana do são João Acima, aos 22 de dezembro de 1898, foi o pioneiro da industrialização local e a mais importante expressão da família Souza Moreira de Bonfim. Fundou a Casa Comercial "Moreira & Filhos", de grande importância para a formação econômica e histórica de Itaúna. Contribuiu para transformar o arraial de Santana no principal empório comercial da região Centro Oeste de Minas.

Foi na firma "Moreira & Filhos" que Manoel Gonçalves de Souza Moreira, João de Cerqueira Lima e Josias Nogueira Machado (respectivamente filho e genros do seu patrão), aprenderam e se tornaram hábeis comerciantes. Manoel Gonçalves de Souza Moreira foi um legítimo herdeiro das qualidades e virtudes de seu notável pai, que ainda muito jovem se tornou sócio da firma "Moreira & Filhos", no qual, trabalhando arduamente fez carreira de balconista a gerente, acumulou desde cedo bom patrimônio e vivendo exclusivamente para o trabalho.

Participou ativamente na estruturação da Companhia de Tecidos Santanense, de que, foi fundador com seu pai, Manoel de Souza Moreira. Quando da Assembleia Geral da fundação realizada em 23 de outubro de 1891, com apenas 29 anos de Idade, subscreveu 400 ações, no valor de 80 contos, importância altamente expressiva para época, somente precedido por seu pai, Manoel José de Souza Moreira, que subscreveu 600 ações, no valor de 120 contos de réis. Ele e seu pai eram realmente os únicos ricos da família. Depositaram no Banco do Império do Brasil os 60 contos de réis necessários, 30 de cada um deles, como caução, para lançar as ações da primeira sociedade anônima de Itaúna.

Foram a pedra fundamental da mentalidade capitalista de Itaúna, capitalismo caboclo, familiar e paternalista. Manoel Gonçalves de Souza Moreira, foi diretor e tesoureiro da empresa desde sua fundação até o ano de 1904, quando, atraído pelo rápido progresso na nova capital mineira, inaugurada em 12 de dezembro de 1897, no qual, se transferiu pra Belo Horizonte.

Lá com sua mentalidade de empresário bem-sucedido, foi um dos fundadores da Companhia Industrial Belo Horizonte, com capital de 600 contos de réis, sendo eleito na Assembleia de Constituição, realizada aos 28 dias de agosto de 1906, membro da primeira diretoria, para o mandando de 1906 a 1911, composta pelos fundadores da sociedade, a saber: Cel. Inácio Magalhães; Cel. Manoel Gonçalves de Souza Moreira e Cel. Américo Teixeira Guimarães.

Ante monarquista histórico, foi o principal fundador em 21 de abril de 1889 do "Clube republicano 21 de Abril", de Sant'Ana do São Rio João Acima, sendo eleito pelos noventa membros que o acompanharam na fundação, e também pelas principais lideranças santanenses, presidente do clube e que se filiou ao Centro Republicano, de igual nome, em Ouro Preto. Foi também o criador, em 13 de abril de 1890, do semanário o "Centro de Minas", o primeiro jornal a circular em Sant'Ana do Rio São João Acima.

Ao regressar de sua viagem à Europa, em Paris, na Cidade Luz, já idoso, passou a meditar em profundidade sobre o destino a ser dado ao expressivo patrimônio por ele acumulado. Não possuía filhos e amava Itaúna, a terra de seu nascimento. Espírito cristão e fraterno tomou a mais importante decisão de sua vida modelar: fundar, em sua terra natal, uma "Casa de Caridade", e doar parcela substancial de seu grande patrimônio a uma instituição que viesse a ser construída com o objetivo de instalar e manter o hospital, um asilo de velho, um pavilhão para tuberculosos; bem como investir, conforme recomendado em seu testamento, na educação dos jovens itaunenses.

Casou-se com a sua prima Maria Gonçalves de Souza Moreira, conhecida por Dª Cota, no qual, foi uma das mais extraordinárias personalidades de Itaúna, sem dúvida o maior filantropo do século XX em nossa cidade, pelo seu alto espírito humanitário. Este ato o credenciou ao respeito, ao apreço e à eterna gratidão de todos itaunenses, pois se transformou em nosso maior benfeitor. Faleceu em Belo Horizonte, aos 20 dias de junho de 1920, aos 68 anos de idade, sendo sepultado, como do seu desejo, em Itaúna, junto à "Casa de Caridade" que ostenta o seu benemérito nome.

Sua Viúva, Dª Maria Gonçalves de Souza Moreira, a caridosa Dª Cota, alguns anos após, impulsionada por seus sentimentos cristãos e inspirada no belo ensinamento de seu esposo, fundou o "Orfanato São Vicente de Paula". Ela faleceu em 26 de novembro de 1954, aos 79 anos de idade, sendo sepultada, em Itaúna, como de sua vontade, sendo verdadeiro que ela se tornou benfeitora e benemérita.

Esta é a origem da "Casa de Caridade Manoel Gonçalves de Souza Moreira", da Escola Normal e do Colégio Santana.



2ª Biografia

Entre os itaunenses ilustres, um dos maiores foi, sem dúvida, Manoel Gonçalves de Sousa Moreira. Morreu no primeiro quartel do século XX, quando ainda havia muita insensibilidade diante do sofrimento. E ele pensou em todos os necessitados. Dono de uma fortuna considerável, usou de seu patrimônio para construir a Santa Casa e deixar-lhe fartos meios de subsistência. Pediu em testamento, que com o excesso das rendas do hospital, fossem construídos dois colégios - um para moças e outro para moços.

E temos a Escola Normal e o Colégio Santana, erguidos com o que sobrava à Santa Casa. Mais tarde, sua viúva, Maria Gonçalves de Souza Moreira, Dª Cota, como a chamávamos, fundou o Orfanato São Vicente, dotando-o também com valioso patrimônio. Assim, o que temos de melhor, na área da educação e da caridade - exceto a Universidade - devemos a Manoel Gonçalves de Souza Moreira. Não o conheci, lembra-me apenas o dia em que seu corpo chegou para um velório, numa das salas da Santa Casa, recém construída. Lá estive ainda criança, com minha mãe que lhe fora prestar sua última homenagem.

Um dos grandes valores doados à Santa Casa por Manoel Gonçalves de Sousa Moreira foi sua casa de residência, ampla e bonita, que eu conheci. Ocupava um lote enorme, na Rua Tupis, quase na esquina da Avenida Afonso Pena, onde hoje se erguem uma igreja e um colégio protestantes.

O lote e o local eram de tal modo privilegiados que Ferreira Gonçalves, um grande amigo de Itaúna, na época de seu apogeu, fez uma oferta extraordinária à Santa Casa. Construiria ali um belo prédio de 14 pavimentos.  A Santa Casa exploraria as lojas, no térreo e ele, Ferreira Gonçalves, durante 10 anos os 13 pavimentos superiores. Ao fim dos 10 anos a Santa Casa se tornaria proprietária de todo o prédio. Pude ver o projeto, pois Ferreira Gonçalves, ainda hoje é um bom amigo, apesar de agora nos encontrarmos raramente e ele já estar vivendo os seus noventa e tantos anos.

 Itaúna é devedora a Manoel Gonçalves de Sousa Moreira de uma justa homenagem. Faz pena ver o seu túmulo, ali na velha Santa Casa, tão esquecido e abandonado. Nada mais justo do que perpetuar-lhe a memória, com um bom monumento, numa das praças da cidade. Mais que ninguém ele o merece. A administração que o fizer terá honrado um dos maiores, se não o maior dos itaunenses.






REFERÊNCIAS:
Pesquisa: Charles Aquino, Patrícia Gonçalves Nogueira
Organização: Charles Aquino
Acervo: Instituto Cultural Maria Castro Nogueira
Projeto de Lei dos Logradouros: Prefeitura Municipal de Itaúna
1ª Biografia: Guaracy de Castro Nogueira (In memoriam)
2ª Biografia: Monsenhor Hilton Gonçalves de Sousa (In memoriam) / Jornal Brexó,1983.
Lei Municipal de Itaúna nº 187, p.215, 1927.
Colaboradora: Viviane Nogueira Mello
Acervo: Hospital Manoel Gonçalves / Itaúna-MG



quinta-feira, 18 de maio de 2017

JOVE SOARES

 Lei Municipal 0214/53 - CEP: 35680-346 e 35680-352
Denomina logradouro público: Av. Jove Soares / Centro,Graça, Pio XII

LEI Nº 214, de 29 de dezembro de 1953
Denomina avenida marginal ao Córrego da Praia...
O Povo do Município de Itaúna, por seus representantes, decreta e eu, em seu nome, sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Denominar-se-á CEL. JOVE SOARES a avenida marginal do Córrego da Praia.
Art. 2º Revogadas as disposições em contrário, esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.
Mando, portanto, a todas autoridades, a quem o conhecimento desta Lei pertencer, que a cumpram e a façam cumprir tão integralmente como nela se contém e declara.

Prefeitura Municipal de Itaúna, 29 de dezembro de 1953
Dr. Victor Gonçalves de Souza - Prefeito Municipal
Antônio Orlando Botelho Nogueira - Secretário



BIOGRAFIA


Ombro alto, magro, 1,75 de altura, cenho carregado, cabelos ralos e grisalhos, barba e bigode feitos, lúcido e jovial, aos 85 anos de idade, andava o Cel. Jove Soares Nogueira teso e desempenado como um moço.

Nascera aqui mesmo na fazenda das Três Barras, quando Sant'Ana do Rio São João Acima era distrito da cidade de Pitangui, em 8 de julho de 1868, na quadra mais tormentosa da guerra do Paraguai, entre as batalhas de Humaitá e Itororó.

Era filho de Firmino Francisco Soares, de Jaguaruna, hoje Onça de Pitangui, e de Fabiana Nogueira Duarte, filha caçula do velho Manoel Ribeiro de Camargos, da fazenda da Vargem da olaria, um dos turunas da sua época, nos tempos de Santana.

Aos 26 anos de idade, isto é, em 25 de agosto de 1894, casara-se com sua prima Augusta Gonçalves Nogueira, uma garota de 16 anos , viva e bonita, inteligente e prendada, filha primogênita de Josias Nogueira Machado, que lhe enfeitiçou a vida e lhe infundiu animo e força de vontade para trabalhar como um gigante, criar uma família de onze filhos, dar a estes educação e estudo nos melhores colégios, deixando a todos, tranquilo e orgulhoso de sua obra, o amparo de uma dignificante educação moral e cívica, de uma boa cultura e de regular fortuna. No tempo de sua mocidade, fora sobretudo boiadeiro.

Não era do tipo desgracioso, desengonçado e torto da personagem de Euclides da Cunha, mas possuía em toda a sua plenitude a tenacidade, a bravura e a fortaleza do sertanejo.

Não possuía o hábito de se recostar, quando parado, ao primeiro umbral ou à parede que encontrasse; nem cair de cócoras sobre os calcanhares; nem o de descansar sobre   os estribos, quando sofreava o animal, pra trocar duas palavras com um conhecido. Era um sertanejo um tanto quanto civilizado, sem chapéu de abas largas, de vestimenta comum, com muita compostura nos gestos e nas palavras.

Impulsionado pela fibra inata, deste meninote se acostumou a varar os sertões. Acompanhado do criolo Hortêncio, ou do preto Paulino, ou do seu primo Versol, ombro alto, relho de cabo de peroba à mão, tronco pendido para frente e oscilando à feição do trote de seus surrados cavalos, desferrados e tristonhos, rumava para Goiás, por trilhos, veredas e estradas quase intransitáveis, em busca de gado.

 Sem saber nadar, vadeava rios caudalosos agarrado à cauda de seu animal. Isto numa era em que não existia nem o avião, nem o automóvel e nem o rádio. Levava três meses tangendo vagarosamente, daquelas brenhas longínquas para Santana, o gado bravio e chucro ali adquirido. Ora cantarolava em surdina atrás daquela mole ondulante toada de senzala; ora afundava nas caatingas garranchentas colado a um garrote arribado e esquivo; ora lutava loucamente para conter o estouro da boiada.

Em casa, só ficava o tempo necessário à engorda do gado invernado nas suas fazendas da Bagagem, das Três Barras e do Pedro Gomes.

Se não lhe aparecesse comprado à porta, com a mesma fibra e tenacidade, punha o gado gordo em marcha e ia vende-lo à charqueada de Santa Cruz, ou abatê-lo em Niterói, no Estado do Rio, outra tirada de mais de seiscentos quilômetros no lombo de seus célebres cavalos.

Tinha apenas o conhecimento das primeiras letras; mas, inteligente e cônscio disso, sabia porta-se com compostura, nas reuniões mais seletas. Trazia sempre pronta uma verve de ironia para os pomadistas, para os pelintras e para os metidos a sabichões. Bom palrador, deliciava-se com uma boa prosa, simples ou picante. Pouco crédulo, desconfiado e sem respeito humano, nunca se deixou apanhar por espertalhões. Estava sempre a par do que ia pelo mundo, através da leitura dos jornais, no que era um viciado. Não fumava, não bebia e não jogava, mas em compensação fora um emérito galanteador, fino e respeitoso.

Na luta pelo direito, era um obstinado; demandista, ferrenho, porém leal. Chegara até a demandar, em pleitos memoráveis, na repulsa daquilo que julgava intolerável injustiça, com um irmão amado e com o vigário João Ferreira Álvares da Silva. Era visceralmente econômico. Dava ao dinheiro extraordinário valor, talvez pelas canseiras do trabalho honrado e duro em adquiri-lo e por possuir no mais alto grau o senso da previdência. 

Depois dos quarenta e dois anos, convidado respectivamente pelos amigos Dr. Augusto Gonçalves de Souza, Cel. João de Cerqueira Lima, Dr. Cristiano França Teixeira Guimarães, e Dr. Tomas de Andrade, fundara com os mesmos, em maio de 1911, a Companhia Industrial Itaunense, e em janeiro de 1923 o Banco Comércio e Indústria de Minas Gerais, S.A., de que fora grande entusiasta e onde invertia invariavelmente as suas economias na compra de suas ações.

Com o falecimento do Cel. Antônio Pereira de Matos, ocorrido em 27 de fevereiro de 1926, fora eleito diretor secretário da Itaunense , posto em que se manteve pela consideração de seus amigos até o fim de sua vida.

Nunca fora forte em política.  Mas vangloriava-se em tom de caçoada, em poder contar, em qualquer emergência, com dois votos seguros: o da Galinha Gorda, seu rendeiro da fazenda da Bagagem, e o do Antônio Luiz, seu sobrinho por afinidade. Mas, mesmo assim , foi vereador à primeira Câmara Municipal de Itaúna , em 1902 , mandato que lhe foi renovado até 1916; e foi Conselheiro Municipal  em 1932 e 1936.

Enviuvou-se em 14 de maio de 1935. E venerou a memória de sua esposa querida até o último alento. Todas as tardes, ao pôr do sol, em casa ou em qualquer lugar em que estivesse, voltava-se em espírito e coração pra o local onde jazia a amada, guardando uns minutos de silêncio, rezando baixinho, ou balbuciando coisas ininteligíveis, como a confidenciar com alguém de muita estima e respeito.

Falecera em 17 de novembro de 1953. Fora um bravo até para morrer. Se lhe fosse possível vencer a morte, ele a venceria, porque com ela disputava palmo a palmo, conscientemente, bravamente, o direito de viver um pouco mais, contendo, inúmeras de suas tremendas investidas, contrariando todos os prognósticos dos médicos assistentes, até tombar inconsciente, debaixo de seus inexoráveis tentáculos.





REFERÊNCIAS:
Pesquisa: Charles Aquino, Patrícia Gonçalves Nogueira.
Organização & Fotografia: Charles Aquino
Biografia: Mário Soares
Projeto de Lei dos Logradouros: Prefeitura Municipal de Itaúna
Fonte: Revista Acaiaca nº 56, org. Celso Brant,1952, p.28,29,30,31.
Acervo: Instituto Cultural  Maria de Castro Nogueira - ICMC


domingo, 14 de maio de 2017

JOÃO DE CERQUEIRA LIMA

Decreto de Lei 29/38 L4 – CEP: 35680-063
Denomina logradouro público: Rua João de Cerqueira Lima / Centro


 1ª BIOGRAFIA


"Ontem, à tarde, ao sol posto,
Passei junto à tua porta,
E vi com grande desgosto
Que minha esp'rança era morta"

Ele escreveu esp'rança à portuguesa e não esperança, sonoramente à brasileira. São versos da Revista " Cigarra do Sertão", que João Lima, Mário Matos e eu escrevemos, já lá vai um punhado de anos.
Basta o esp'rança para se descobrir que a quadra saiu da pena lírica de João de Cerqueira Lima.
Posto que tinha vindo bem pequeno para o Brasil, a linguagem revela desde logo a origem.  Mamou o leite materno em Portugal, na Beira, em Castanheira de Pêra, onde viu a luz pela primeira vez, no dia 21 de abril de 1870.  Menino e não moço ainda, levou-o o destino pra longes terras. Seus pais, Antônio de Cerqueira Lima e Maria Júlia de Cerqueira Lima, resolveram abandonar a pátria e emigrar, com os filhos, para o Brasil.
A imaginação de sonhador, o espírito de aventuras, a alma de romântico, a ânsia do desconhecido, o desejo de viagens fantásticas, a ilusão de mundos novos, virgens e ignotos em remate, os mares de D.Afonso Henriques, a alma portuguesa enfim, sonhadora e romântica, lírica e aventureira, ensofrega e destemerosa, irrequieta e angustiada não permitiram que o lusitano Antônio de Cerqueira Lima envelhecesse calmamente e mansamente na pátria amada.
Por isso, com a família, atravessou o Atlântico, rumo ao Brasil, isto é, ao desconhecido, em viagem perigosa, que todas eram, naquela época. Chegado que foi ao Rio de Janeiro mete-se com a família pelo interior, e junto com os tropeiros, cavalgando ásperos burros de cela, afundou 600 léguas sertão bruto a dentro, atravessando a perigosíssima serra da Mantiqueira, onde tinha seu quartel bem organizada quadrilha de gatunos, que para roubar, matavam os viajantes desprevenidos.
E veio com a família terminar viagem no centro, no coração de Minas Gerais, instalando-se na cidade de Bonfim, onde se estabeleceu com uma casa comercial. Seu filho, o nosso João de Cerqueira Lima, contava apenas 10 anos de idade, e, para fazer a viagem, acompanhando os pais, interrompera os estudos primários que frequentou apenas durante 6 meses.
O menino João de Cerqueira Lima, ajudava o pai, por todos os meios ao seu alcance, não rejeitando serviço por duro ou pesado, indo de servente de pedreiro a caixeiro do pai, da casa de comércio. As compras para sortimento de negócio, eram feitas em Sant'Anna de São João Acima, na casa de comércio de Manoel Gonçalves de Souza Moreira.
Nota-se, de passagem, a força, o poder deste arraial de Sant’Anna, a futura cidade de Itaúna. Era o arraial grande e poderoso empório comercial, onde havia dois estabelecimentos notáveis, a casa de Manoel Gonçalves de Souza Moreira e a casa de Josias Nogueira Machado. Assombroso, por numerosíssimo, era o movimento de tropas e tropeiros, que de Sant'Anna de São João Acima partiam em todas as direções. O pequeno e modesto arraial supria de tudo, fornecendo, quaisquer mercadorias, não só a muitos arraiais como ainda a várias cidades.
Antônio de Cerqueira Lima, porém, não prosperou. Ou porque fosse muito bondoso ou porque o estabelecimento não rendesse o suficiente para sustentar a família, o certo é que fracassou o empreendimento comercial, falindo. Como consequência, ficou devendo a Manoel Gonçalves de Souza Moreira a importância que montava a um cento e tanto. Sempre foi o português Antônio de Cerqueira Lima homem e correto, e, no descalabro de seu negócio, tomou as providências necessárias para saldar todas as dívidas. Não encontrou, porém, jeito de fazer o pagamento, a Manoel Gonçalves de Souza Moreira, e o recurso foi mandar o filho João trabalhar como caixeiro, até que fosse feito pagamento total, aos poucos, mediante um minguado ordenado que recebia.
E João de Cerqueira Lima, quando veio para Sant'Anna de São João Acima, trabalhar para pagar a dívida paterna, contava apenas11 anos. Uma criança que precisava de brinquedos, ia lutar duramente, com a grave responsabilidade de saldar a dívida contraída pelo progenitor. Deixou o pai amado, e a mãe idolatrada, os irmãos queridos e, montado num burrico qualquer, partiu para o arraial bravo, cheio de lutas e ambições, de gente aventureira, que surgia de todas as bandas, sem freios e nem policiada, onde todas as noites havia rixas e desavenças, tiros e facadas, feridos e mortos. Partiu com 11 anos de idade, mal sabendo ler e fazer contas para trabalhar para um patrão severo e rigoroso. Conseguiu com paciência e tenacidade pagar a dívida, tendo mais resignação que o Jacó da Bíblia, pois levou 11 anos trabalhando para pagar tudo. Entrou para a casa com 11 anos de idade e a deixou com 22 anos, recebendo, após o acerto de contas, a importância de uma pataca.
Bendita a hora, em que chegou a Sant'Anna de São João Acima o menino João de Cerqueira Lima! Bendita dívida, que obrigou o menino João de Cerqueira Lima a permanecer em Sant'Anna.
Por que João de Cerqueira lima veio a ser um dos maiores vultos de Itaúna? Porque foi ele quem consolidou a Fábrica de Tecidos Santanense, na iminência de um geral fracasso. Porque foi ele que ergueu, junto com Dr. Augusto Gonçalves de Souza a Cia. Industrial Itaunense, de que foi a alma. Porque Itaúna deve a João de Cerqueira Lima a riqueza que possui, a grandeza que ostenta, o progresso que causa admiração, a força industrial que a anima.
Sim, porque, se não fossem criadas as duas poderosas as duas poderosas indústrias de tecidos, que se devem em última análise, a João de Cerqueira Lima, Itaúna estaria hoje modorrando ao sol, como cidade morta.  Mas, continuemos a seguir a vida do lutador.
O trabalho de caixeiro lhe dava poucas horas de folga, que era, porém bem aproveitadas pela criança inteligente e séria. E só podia dispor desses raros momentos de fazer, pois aos domingos e dias santos. O trabalho era dobrado. Em geral, as populações das roças, fazendeiros e lavradores, preferiam os domingos e dias santificados para as compras. Vinham à missa, passavam e faziam compras necessárias. Havia, assim, nos dias destinados ao descanso, desusado movimento, verdadeira azafama, que punham os pobres caixeiros numa roda viva.
O menino, cujo caráter a dureza da vida amoldara rijamente, nas horas vagas, ao invés de brincar ou passear, tratava de estudar, procurando compreender consigo mesmo o que não pode fazer na escola, por a ter frequentado somente seis meses.
Formoso exemplo de autodidata. E não foi o único que apareceu em Sant'Anna. Mais dois pelos menos merecem ser citados e foram Aureliano Nogueira Machado, cujo diploma de farmacêutico trazia a assinatura de D. Pedro II e Joaquim Marra da Silva, o jornalista de linguagem correta e castiça, foram mais ou menos contemporâneos, ainda que João de Cerqueira Lima fosse bem mais moço. O fato exato é que João de Cerqueira Lima, em pouco tempo, sem professor e sem guia, fazia a escrita da cassa, com perícia e perfeição como competente contabilista, isto, aos 16 anos de idade, isto é, cinco anos depois que bons ventos o trouxeram para Sant’Anna. Quando contava 20 anos, teve que assumir a direção da casa, porque Manoel Gonçalves de Souza adoecera de reumatismo e ficara preso ao leito, entrevado, durante quase 2 anos.
Encontrou o povo de Sant'Anna a murmurar, dizendo que o negócio iria por água abaixo, porque o jovem João de Cerqueira Lima não daria conta do recado, e, faltando o chefe, que sempre esteve à frente, tudo iria mal. E muita gente boa antegozava o fracasso do negócio, numa satisfação mal dissimulada. A fim de estimular o rapaz e dar-lhes mais ânimo. Manoel Gonçalves de Souza Moreira prometeu-lhe dez por cento sobre os lucros, se os houvesse.
Curado o patrão, tornou a assumir a direção de seu estabelecimento comercial, e, foi quando houve a desavença, que os separou. A casa dera mais lucros sob a direção do moço do que antes. Parece que o patrão não gostou, e, no acerto de contas, houve atrito e discussão, e, como resultado, o moço João de Cerqueira Lima deixou a casa, onde trabalhou 11 anos seguidamente. Por esse tempo já andava de namoro com a senhorita Ana, na intimidade Aninha, filha do Coronel Manoel José de Souza Moreira. Na igreja, que foi mais tarde demolida, situada no largo da Matriz, durante a missa, é que ele via a namorava o brotinho Aninha. Como a semana demorava a passar, para que chegasse o abençoado domingo! E era um instante apenas, pois tão pouco lhe parecia a meia hora da missa, finda a qual corria para o balcão, a atender o povo das roças, que queria fazer compras.
 A moça Ana ficou verdadeiramente apaixonada pelo rapaz, que era elegante, de boas falas e já perito na metrificação. Com certeza, compôs-lhe muitos madrigais apaixonados, poeta que era, mas possível não foi obter sequer uma poesia a esse respeito.  Manoel José de Souza Moreira, via o namoro com bons olhos, pois, adivinhava no moço, honesto, sério e trabalhador, um homem de futuro.  Não pensava, assim, o filho de Manoel Gonçalves de Souza Moreira, o Manoelzinho ou o Moreira, como era chamado. Com o amparo do pai e do irmão da jovem, Jovino Gonçalves de Souza, o namoro progredia, para em breve chegar ao noivado. Dizem que Manoel Gonçalves de Souza Moreira, o Manoelzinho, fizera grande oposição, chegando a ponto de oferecer à mana a quantidade de cem contos de reis, fortuna imensa naquele tempo, para que ela abandonasse o João Lima, não se casando com ele. Parece lenda, porque a importância é mesmo fabulosa. O fato é que a menina Aninha não quis saber do dinheiro, porque estava doidinha para se casar com o João.  Pelo menos diz, um antigo jornalzinho, que se publicou em Itaúna:
 - "A menina Aninha queria porque queria casar com o João, e, quando escutava o sino da Matriz, era assim que o sino falava: Casa com o João que o João é bom! Casa com o João que o João é bom! Ouviu o conselho do sino e casou mesmo com o João".
Já nesse tempo de namoro, negociava João de Cerqueira Lima de sociedade com Jovino Gonçalves de Souza, seu futuro cunhado, de quem era muito amigo. O casamento de João de Cerqueira Lima e Ana Gonçalves de Souza foi celebrado no ano de 1894, na mesma Matriz, onde começaram o namoro.
Tratava-se por esse tempo, da construção da Fábrica de Tecidos Santanense, empresa gigantesca para aqueles tempos remotos. Manoel José de Souza Moreira com seus irmãos José Gonçalves de Souza, Francisco Gonçalves de Souza e Vicente Gonçalves de Souza, e, também, seu filho Manoel Gonçalves de Souza Moreira estavam edificando ou construindo a Fábrica, cujo capital inicial era de seiscentos contos, um capital muito elevado, considerada para a época. As dificuldades eram imensas, basta lembrar que, desde o Rio de Janeiro até Sant'Anna de São João Acima, todas as máquinas, e muitas eram pesadíssimas, tiveram que ser transportadas nos lombos dos burros ou em carros de bois, numa viagem lenta que durava meses. E as dificuldades foram sempre subindo de ponto, de tal jeito que a turma desanimou e estava resolvida a liquidar a incipiente Fábrica. A turma, não. É preciso explicar bem. Manoel José de Souza Moreira não desanimou nem concordou ou consentiu que se liquidasse a empresa. Desanimado, o filho Manoel não quis mais continuar à frente do empreendimento. Nesse ponto, foi lembrado João de Cerqueira Lima e o sogro o levou para a direção da Fábrica. Deixou assim, o comércio, no ano de 1895, para assumir a gerência da Fábrica de Tecidos Santanense.
Em pouco tempo, reergueu a empresa, evitando que se perdesse tanto esforço e tanto capital. Não pode, porém, continuar muito tempo, pois houve grave atrito e desavença com o cunhado Manoel Gonçalves de Souza Moreira, que, afinal, voltou a dirigir a indústria de tecidos.
João Lima retornou ao comércio, estabelecendo-se com nova casa comercial, à rua Silva Jardim, esquina com Artur Bernardes, onde hoje está a casa de seu filho João de Cerqueira Lima Júnior. A primeira casa comercial de sociedade com Jovino Gonçalves de Souza estava situada na mesma rua, porém, mais abaixo, mais ou menos onde está hoje a casa do Sr. Francisco Francisco Guimarães, à praça Luiz Ribeiro.  Ai, na rua Silva Jardim, negociou até o ano de 1911 quando se deram dois fatos auspiciosos para Itaúna — A chegada da Estrada Oeste de Minas e a Fundação da Companhia Industrial Itaunense.
João Lima vendeu a casa comercial e foi ser diretor gerente da Cia. Industrial Itaunense, que dirigiu, administrando, com muito tino e argúcia, até o ano de 1938, em que já doente passou a cargo a seu filho José de Cerqueira Lima, que é o atual diretor gerente. Itaunense notável entre os mais notáveis, ainda que nascido em Portugal, João de Cerqueira Lima passou toda a vida em Itaúna, desde a infância à velhice, dedicou toda a existência a este torrão bendito de Sant'Anna de São João Acima. Por esta terra lutou, empenhando todas as forças e recursos em todos os setores, quer no social e político que no econômico ou industrial. Não se indigita cometimento de vulto em Itaúna que não traga a marca do lutador resoluto, não há fato de importância que não ostente algum sinal de sua presença. Entretanto, não quis o destino que, assim como não nascesse em Sant’Anna, viesse, também, a falecer na cidade que ajudara eficientemente a edificar e amava tanto.
Grave enfermidade o levara ao Rio de Janeiro, na intenção não só de lhe minorar os padecimentos, como, e principalmente, de prolongar a existência.
Nascera esse grande itaunense (seja -se permitido dizer assim, que fora sempre, como os maiores, de toda a alma e coração) em Portugal e falecera, no Rio de Janeiro. Caprichos do destino. Falecido na Capital Federal, a 11 de setembro de 1942, foi o corpo conduzido para Itaúna, em cujo cemitério municipal, foi inumado no dia 12. No dia da chegada do corpo em Itaúna, imensa multidão encheu o largo da Matriz, havendo encomendação assistida por toda a população, que contrita, ou em prantos ou em preces fervorosas, assim homenageava o grande homem, tão estimado de todos, já dos ricos, a quem, sempre, amparou ou antes ajudou a enriquecer, já dos pobres e da engrandecida mole de operários, a quem amenizou a dureza da existência, oferecendo trabalho, propiciando meios dignos de subsistência.
Itaúna precisava de render uma homenagem de relevo ao grande filho, não só num preito de gratidão, mas principalmente num elegante gesto de justiça. É verdade que a rua onde se localizou a Fábrica de Tecidos que fundou, consolidou e dirigiu, com competência, brilho e dignidade, recebeu seu nome, conforme decreto do Prefeito de então. Além da rua João de Cerqueira Lima, que lembra o nome do imorredouro itaunense, há necessidade outra homenagem maior, de imponência e de culto condizentes com a grandeza rebrilhante do homenageado.
Deixou os seguintes filhos, que seguem o exemplo paterno, na honradez, no trabalho, na dignidade e na inteligência: José, João, Afonso, Manoel Maria e Alice. Havia o sétimo, Ana moça prendada, que adoecendo de gripe pulmonar, no Colégio de Mariana, onde estudava como aluna interna, partiu ainda gravemente enferma para Itaúna, onde veio a falecer poucos dias depois. Morrera na flor da idade, quando contava 18 anos.
Além desses filhos, houve mais três, que faleceram, quando pequenos: O 1º José, a 1ª Ana, a 1ª Maria.  Houve, pois, dois filhos com os nomes José, Ana e Maria.
Em memória, aqui ficam estas palavras, como singela homenagem de Itaúna agradecida a João de Cerqueira Lima.

2ª BIOGRAFIA 


Célebre personagem que se fez dentro de nossa terra e que aqui chegara aos 10 anos de idade, vindo antes das Plagas Lusitanas, natural de Castanheira de Pêra bem ao pé de Coimbra, onde nascera a 21 de abril de 1870, filho de Antônio de Cerqueira Lima e de Maria Júlia Baeta Neves. Já então Maria Júlia de Cerqueira Lima, nome registrado em Portugal de conformidade com a herança matrimonial; era irmã do velho Caetano Baeta neves, de muitos anos antes, radicado em nossa vizinha cidade de Bonfim.
Em 1879 Antônio de Cerqueira Lima viera ao Brasil preparar ambiente de trabalho para trazer mais tarde sua família, que havia deixado em Portugal.  Dirigiu-se logo que chegou a Minas, para a cidade de Bonfim, onde exercera a função de pedreiro, trabalhando na construção da Igreja daquela localidade. Um ano depois, fim de 1880, voltou a Portugal para buscar a família. João de Cerqueira Lima que já trabalhava em Portugal como auxiliar de pedreiro caiu certo dia de um pinheiro e esteve prestes a amputar sua perna esquerda, mas, o destino reservou-lhe a cura do ferimento e viu-se livre de perder a perna.
Quando a família, pressurosa leu no jornal os nomes de passageiros do navio que levava de regresso Antônio de Cerqueira Lima, sentiu-se feliz, porém já lhe falecido sua filha menor Maria Guilhermina, que falecera em terna idade. Seus filhos até então restantes eram: João de Cerqueira Lima, Cristina de Cerqueira Lima e Fortunata de Cerqueira Lima, os quais foram aos cais do porto, assistir ao desembarque de seu pai Antônio de Cerqueira Lima. Assim que viram surgir um senhor de fisionomia atraente e de barbas negras, correram-lhe ao encontro e perguntaram-lhe: É o senhor, nosso pai Antônio de Cerqueira Lima? Acolhidos pelo papai, seguiram juntos.  Indescritível a euforia de todos em sua residência. Desde então, prepararam a mudança e em janeiro de 1881 vieram para o Brasil.
Chegados ao Rio de Janeiro em fevereiro de 1881, logo que obtiveram a devida licença para o desembarque, foram para a quinta dos Irmãos A. Bebiano, fortes comerciantes de secos e molhados, estabelecidos na rua 1º de março, no Rio de Janeiro, e primos de Maria Júlia de Cerqueira Lima, onde permaneceram durante cinco dias e dali se transportaram com destino a minas seguindo diretamente para a cidade de Bonfim, onde passaram a residir.
Quatro anos depois, em 1885 resolveu Antônio de Cerqueira Lima seguir com a família para o povoado de Papagaios de Pitangui, onde passaria a comerciar. Foi nessa ocasião que João de Cerqueira Lima que havia ficado em Itaúna, para trabalhar como caixeiro junto à Firma Comercial Moreira e Filhos, assumir aos seus quinze anos de idade responsabilidade do pagamento de um débito de seu pai de trinta contos de reis (30:000$000) dinheiro que havia obtido por empréstimo, para abrir casa comercial em Papagaios MG. E foi com a máxima pontualidade que o filho lhe cobriu o débito.  Tais foram os dotes de atividade, honradez e inteligência do menor João de Cerqueira Lima, que três anos depois, aos seus dezoito anos de idade, elevava-se ao cargo de Guarda-Livros da firma e dois anos depois, aos vinte de idade, ao cargo de gerente da mesma firma. Na qualidade de gerente da firma, casou-se com Dona Ana Gonçalves de Souza Moreira que passou a assinar Ana Gonçalves Lima e estabeleceu-se por conta própria com uma pequena casa de comércio que lhe dera possibilidade de vencer.
Capacitado para o comércio e para a indústria, foi escolhido para gerente da Companhia de tecidos Santanense, que na ocasião estava em grande dificuldade. Ao lado de seu cunhado Dr. Augusto Gonçalves de Souza e de seu cunhado Cel. Antônio Pereira de Matos, fundou em 1911 a Companhia Industrial Itaunense, que foi uma de suas maiores vitórias e como prêmio de seu alto espírito moral e empreendedor. Basta dizer que em 1912 a referida empresa esteve quase a abrir falência, tal era seu excesso de produção, sem a satisfatória procura da mercadoria fabricada, em seu ainda restrito mercado de consumo.
Entretanto, sorria-lhe o destino, pois, em 1914 explodiu a Primeira Guerra Mundial todo o estoque fabricado com o máximo de procura, foi rapidamente vendido. E daí para diante, vemos à nossa frente a grande realização de João de Cerqueira Lima.
Além de tudo isto, era João de Cerqueira Lima exímio poeta e escritor, porem só escrevia e manifestava suas produções literárias a amigos íntimos, pois, sua modéstia jamais permitiu que ele publicasse o que escrevia. Chegou a colaborar com Mário Matos e Lincoln Nogueira Machado em várias revistas, sendo que, na última delas, fez trabalhar como protagonistas, seu filho José de Cerqueira Lima e sua nora Adalgisa Matos.
Mais tarde impossibilitado de continuar em Itaúna por motivo de falta de saúde transferiu-se com sua família para o Rio de Janeiro, onde faleceu a 11 de setembro de 1941 aos setenta e um anos de idade e recebeu sepultura nesta cidade de Itaúna.




REFERÊNCIAS:
1ª Biografia e Acervo:  Dr. Lincoln Nogueira. Revista Acaiaca (Celso Brant / Ano:1954,nº56, p.89).
2ª Biografia e Acervo: Torres do Vale / Arquivo Dr. Antônio Lima Coutinho 
Revisão Biográfica: Afonso Henrique da Silva Lima
Pesquisa: Charles Aquino, Patrícia Gonçalves Nogueira
Organização e fotografia: Charles Aquino
Projeto de Lei dos Logradouros: Prefeitura Municipal de Itaúna

domingo, 7 de maio de 2017

LOGRADOUROS ITAUNENSE

Guaracy de Castro Nogueira

         É lamentável o que ocorre em Itaúna. A vida de uma cidade está na sua alma, a qual, ao longo de sua existência, vai-se vitalizando pelo potencial da gente que se destaca por entre a urdidura humana que a compõe e impele.
         As personalidades marcam um povo, uma localidade. Pará de Minas é apontada como a terra de Benedito Valadares; Três Corações nos lembra de Pelé; Pitangui nos traz às memórias de dona Joaquina do Pompéu e dona Maria Tangará; Bom Despacho recorda Olegário Maciel; Araxá não deixa dona Beja ser esquecida e São João Del Rei é a terra de Tancredo Neves. Estas comunidades se ufanam quando lembradas pelo valor de seus filhos.
         Nos meus encontros com os jovens que me procuram para saber um pouco da história de Itaúna, faço questão de lhes perguntar:  Onde você mora?
Na Rua João de Cerqueira Lima, na Rua Josias Nogueira Machado, na Rua Gonçalves da Guia, na Praça Luís Ribeiro e citam, sem dúvida, nomes de pessoas ilustres que ajudaram a construir a grandeza de nossa comunidade.  Quando lhes pergunto quem foram tais personalidades que deixaram seus nomes em ditas ruas, nada explicam, nada sabem, tudo ignoram. Ninguém está mais aí, para essa do quem é ou quem foi. E, lamentavelmente, há nomes que todos ignoram e que me surpreendem, só conhecidos do autor da lei que os propôs.
         Melhor seria, quem sabe, trocar os nomes dos logradouros públicos de nossa cidade que não cultua seus líderes dos idos passados, para coisas que o povo conhece, porque não, delas dependem para orientar e circular: Rua Direita, Beco da Caridade, Rua do Comércio, Porteira do Mirante, Bairro da Ponte, Beco do Jota, Travessa 2 de Janeiro, Rua das Viúvas, Bairro do Serrado, Rua São Vicente, Rua da Harmonia, Bairro da Vargem, Rua do Rosário, Rua da Linha e tantas outras das quais não me lembro, nomes que fazem parte de nossa história e ainda povoam nossa memória.
         Defendo intransigentemente a manutenção dos nomes dos logradouros públicos. Não será por mera bajulação ou mesmo para homenagear mortos ilustres que se lhes trocará a denominação. Não faltam logradouros públicos novos para se utilizarem no preito àqueles que o merecem. Quem dá nome a logradouros públicos é o povo, através dos vereadores e do consenso da Câmara Municipal. Só em regimes autoritários é que o Prefeito ou a autoridade executiva dá nomes às coisas. Os nomes antigos foram batizados pelo uso e costume dos cidadãos. A lei apenas homologava a vontade popular.
         Até por respeito à história, conveniente seria que se preservassem os nomes antigos muitos dos quais mais saborosos. Onde estão a Rua do Cascalho, a Rua do Canto, a Rua das Piteiras e o Alto da Laje?
         A política é terrível. O nosso Largo da Matriz já se chamou Praça João Pessoa, Praça Mário Matos, Praça Benedito Valadares e agora se chama Praça Dr. Augusto Gonçalves. Extinto o velho cemitério, onde se tentou construir a nova Matriz, boicotada pelos ricos da época, contra a bela planta do arquiteto italiano Rafello Berti, o logradouro ia se transformar numa praça ajardinada em respeito aos mortos que lá foram sepultados, a ele deu-se o nome de Praça Mário Matos. A política destruiu a praça lá edificando o Grupo José Gonçalves de Melo, um clube dançante, um sindicato, e o prédio dos Correios e Telégrafos.  Não arrancaram o nome de Mário Matos, mas destruíram a praça com seu nome, porque todos o consideravam como o autor intelectual do fechamento de nossa Escola Normal.
         Dois nomes em Itaúna foram impostos pelo governo ditatorial: Avenida Getúlio Vargas e Praça Benedito Valadares. A avenida, que era rua, e a praça principal se tornaram nomes dos detentores do poder na época, por força de um decreto do ditador. Os udenistas radicais, que depuseram Getúlio e Benedito, arrancaram o nome do Benedito da praça principal, porque ele havia fechado nossa Escola Normal e só não arrancaram as placas da Avenida Getúlio Vargas, porque o líder queremista Zé Biscoitão, à frente dos operários, se opôs à turba da UDN. No fundo foi um ato de coragem do líder dos trabalhadores e a perspectiva histórica nos diz hoje que Getúlio, no balanço de sua passagem pelo governo, foi um estadista, responsável pela implantação da legislação social em benefício dos mais humildes e dos trabalhadores de um modo geral.
         Trata-se de um problema cultural. Às vezes somos progressistas e até civilizados, mas pouco cultos. Cultura é a expressão máxima de um povo!

Acervo e imagem ilustrativa: Instituto Cultural Maria de Castro Nogueira
Texto: Guaracy de Castro Nogueira (In Memoriam)
Organização: Charles Aquino 


segunda-feira, 1 de maio de 2017

ISAURINO DO VALE

 Lei Municipal 1286/76 / CEP 35680-071
Denomina logradouro público: Rua Isaurino do Vale / Bairro Vila Tavares


Pedreiro, arquiteto, cartógrafo, topógrafo, músico ...

Isaurino do Vale, vibrante personalidade humana e pioneiro do abastecimento d’agua potável em Itaúna, era um cidadão que impressionava a todos pela sua bondade altruística, pela maneira oculta que praticava a caridade.
Nasceu aos 21 de janeiro de 1899 em Queluz de Minas, hoje Conselheiro Lafaiete. Foram seus pais o sr. Manoel do Vale e Dona Maria Petrina Menezes do Vale, possuindo quatro irmãos, com os quais se entendia muito bem e com afinidades fraternais: José Miguel do Vale, Dolores do Vale Gomes, Augusto do Vale e Maria do Vale.
Em 1925 a convite do então Prefeito Municipal, Dr. Dario Gonçalves de Souza, saiu de sua terra natal para o município de Itaúna, com a importante missão de construir uma represa para captação de um novo manancial de água potável para a cidade.
Firmara contrato com o engenheiro Dr. José da Silva Brandão, que recrutara o Dr. Miguel e este, por sua vez, arrebatara daquelas encostas e ladeiras os irmãos Vale — Isaurino e Augusto, para que o auxiliassem na missão da grande empreitada.
A comitiva instalara-se na Rua Direita, hoje, avenida Getúlio Vargas, no casarão azulado e antigo do Vigário Pe. João Pereira, que o alugara para aqueles benfeitores. Dona Maria Petrina de Menezes, mãe dos irmãos Vale, vinha como administradora do lar. Excelente “relações públicas”, logo fez um vasto círculo de amizades na cidade, tornando-se muito admirada.
Daquela equipe fazia parte: pedreiros, cabouqueiros, um carroceiro, um ferreiro, além do carroção que trouxeram para tração da represa. Formavam todos uma só família, obedecendo ordens e aos comandos de Dona Maria Petrina Menezes Vale.
Com muitos sacrifícios até mesmo riscos de vida, iam edificando a represa, dinamitando a pedreira, batendo brocas ferrando bigornas; material transportado à distância pela caravana.
Isaurino e Augusto eram pedreiros competentes. Isaurino chefiava a turma com grande empenhado em um serviço rápido, mas, com segurança. Simpáticos, logo caíram nas graças do povo itaunense, que os acolheram com grande hospitalidade. 
Durante o dia, prestavam serviços à represa. À noite, reunidos no solar antigo, encantavam os moradores com seus instrumentos. Isaurino era exímio ao violão, violino e bandolim. Augusto era igualmente, dedilhava o violão. Um cunhado de ambos, que viera em visita à família ali permanecendo por algum tempo, era clarinetista. Os demais cantavam inclusive Dona Petrina.
Assim, uma orquestra se formara naquela casa para embevecimento de seus vizinhos. Era corrente afinar instrumentos e valsas que enchiam o ar com a harmonia. Modinhas eram ali revividas para alegria geral dos coirmãos. As composições românticas deleitavam ouvidos e corações. Os chorinhos estridentes e brejeiros, como “Sururu na cidade” e “Tico-Tico no Fubá”, eram igualmente interpretadas. Aqueles homens que, durante o dia ofereciam as mãos às marretas, colheres de pedreiro, alavancas e brocas, à noite dedilhavam instrumentos com sabedoria e sensibilidade.
Na luta do homem contra a natureza, conseguiram aproveitar da rocha o que desejavam — perfurações foram obtidas através de explosões e alimentadas pelo grande açude, amparada pelos “ladrões” mecânicos, avançando para as valas previamente abertas e para o paredão levantado. A represa nascia consciente de sua maternal tarefa de alimentar com águas puras, a população da cidade. 
Isaurino, sempre atento no comando de seus homens, liderava ao mesmo tempo, dois grupos diferentes — durante o dia a força física e o cérebro e a noite as emoções com sua música.
Desde o início de seu trabalho na represa fora admitido como funcionário da Prefeitura Municipal. Terminados os trabalhos, não mais voltou a residir em Queluz de Minas. Permaneceu em Itaúna. Seu irmão Augusto mudou-se para o Japão de Oliveira, hoje Carmópolis de Minas, onde casou-se e constituiu família.
Isuarino continuava laborioso, nos quadros da Prefeitura. Era um urbanizador admirável. Autodidata em engenharia. Sempre em ascensão em seus postos, prestava relevantes serviços à comunidade com eficiência e brilhantismo.
Casara-se com Dona Raquel Nogueira do Vale filha de Antônio Esteves Gaio e de Dona Osória Nogueira Soares, nascendo-lhes, apenas uma filha —Inês Antunes do Vale, professora primária, casada com o sr.  Walter Antunes, próspero comerciante e fazendeiro abastado, sendo filhas deste casal, Soraya Antunes do Vale e Silvana Antunes do Vale.
Isaurino do Vale ocupou os mais expressivos cargos na Câmara Municipal de Itaúna:
Ø    1925 — Admitido como Encarregado dos Serviços de Abastecimento de Água e esgoto;
Ø    1928 — Assume a direção dos referidos serviços como administrador;
Ø    1937 — Legalizado para o exercício da profissão, caderneta nº 131;
Ø    1938 — Designado par servir como membro do Diretório Municipal de Geografia;
Ø    1940 — Designado para proceder à revisão da Carta Geográfica do Território do Município e Auxiliar do Serviço de Recenseamento Geral do Brasil;
Ø    1941 —Designado para elaborar uma monografia do Município, no concurso instituído pelo Conselho Nacional de Geografia. Concluído este trabalho e entregue para julgamento, foi aprovado ainda no mesmo ano e foi designado para proceder ao Recenseamento com Base para Elaboração da Monografia Histórico Corográfico do Município de Itaúna. Realizada a obra que deu entrada no Departamento estadual de Estatística de Belo Horizonte. Foi muito felicitado pelo Diretor do Departamento;
Ø    1942   — Designado para as funções de Fiscal do Distrito da Cidade, pelo falecimento do antigo ocupante do cargo. Também neste ano foi designado para chefiar os serviços de Estatística Municipal;
Ø    1944 — Volta a ocupar a chefia dos Serviços de Obras;
Ø    1945 — Designado por ordem do sr. Prefeito para auxiliar ao engenheiro topógrafo, no levantamento da Planta Cadastral da cidade;
Ø    1946 — Assume o cargo de Chefe de Serviços de Obras, por haver concluído os trabalhos designados por Portaria Oficial;
Ø    1954 — Aposenta-se de acordo com as leis vigentes na época.

Isaurino do Vale foi um grande benemérito e Itaúna muito lhe deve. Um precursor do progresso local, colocou todas as suas energias ao labor constante da edificação do município. Faleceu aos 3 de outubro de 1969, em Belo Horizonte, havendo sido trasladado para Itaúna, onde foi sepultado segundo seu desejo. A figura inesquecível do batalhador permanece — pedreiro, arquiteto, cartógrafo, topógrafo, músico e funcionário público de inédito valor e de invulgar talento.



REFERÊNCIAS:
PAULA. Almênio José de. Figuras Notáveis de Minas Gerais, 1973, p.230,231.
Pesquisa: Charles Aquino, Patrícia Gonçalves Nogueira.
Organização & Fotografia: Charles Aquino
Acervo: Instituto Cultural Maria Castro Nogueira
Projeto de Lei dos Logradouros: Prefeitura Municipal de Itaúna
Texto 1: Guaracy de Castro Nogueira  (In Memoriam)


INFORMAÇÕES SOBRE O RESERVATÓRIO E BARRAGEM:


SOBRE O RESERVATÓRIO: Nos anos de 1925 e 1926 foi construído o primeiro reservatório da cidade, localizado na antiga Rua das Viúvas, hoje Agripino Lima, esquina com Rua São Vicente. Os responsáveis pela construção foram Isaurino do Vale e Dr. Alcindo Vieira. Pela Portaria nº 137 de 1928 o Sr. Isaurino do Vale foi nomeado Fiscal de Obras Públicas Municipais. Além de trabalhar na Prefeitura o Sr. Isaurino fazia projetos. Dezenas de casas em Itaúna, inclusive duas para meu pai, foram projetadas pelo mesmo. Isaurino era sogro do Sr. Walter Antunes, proprietário da Granja Maçaranduba.
SOBRE A BARRAGEM: Logo acima do Bairro Nogueirinha, na estrada para o Córrego do Soldado, há ainda hoje, os restos de uma pequena barragem que servia para captação das águas do Ribeirão do Sumidouro donde vinha por gravidade, em grossos tubos de ferro até o Reservatório da Rua das Viúvas.

Pesquisa: Charles Aquino
Fonte: Arquivo Municipal Câmara de Itaúna
Revisão: Prof. Marco Elísio Chaves Coutinho
Texto 2: Juarez Nogueira Franco (In Memoriam)